Archive for abril 2015

Arte de amar

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Nathalia Giordano


Inspirado na peça AMOR que participei com o delicioso grupo Espaço Mágico. Trabalhamos durante um ano, juntei o que me restou das possíveis formas de amar e trago um breve relato.


Inspirado na peça AMOR do grupo Espaço Mágico 
Ir contra palpites óbvios. Ouvir conselhos, virar a esquina. Correr ao seu encontro. Te seguir pelos corredores como uma sombra que escolta seus passos. Deixar o teu calor a alguns metros para fazer o jantar. Te fazer o jantar. Atentar-me a sua respiração ao dormir, ameaçar um abraço, mas virar para o lado. Inflar pulmões com cheiro de vísceras humanas e te querer. Tremer a abstinência de afeto quando não há mais o que oferecer, pedir ainda mais. Não levar a sério suas paranoias. Acampar o tédio em mim ao ouvir em silêncio seus monólogos, assustar-se com o entardecer silencioso. Engolir lágrimas ásperas. Esconder meus defeitos, mas apresenta-los diariamente como um todo. Assistir às falhas de comunicação. Usar suas roupas. Sentir seu cheiro durante o dia, pulsar a saudade em sague quente. Dizer que não posso te encontrar, mesmo quando o peito se dilacera com a distância. Praguejar. Desejar não ter te conhecido, implorar para que o destino cruze ainda mais nossos caminhos.  Reclamar da presença, chorar. Rasgar-se angustiada. Morrer. Morrer de insegurança. Acabar com o amor, fazê-lo renascer no epicentro de todas as flores ao seu redor. Dormir com pés quentes. Aceitar o humor ranzinza, pedir mais afeto em contraponto. Deitar árabe em cama israelita. Assustar-se em brigas, ir embora. Abandonar nosso ninho, voltar três vezes. Errar, aceitar desculpas. Pedir perdão. Errar de novo.  Perder a realidade. Delirar. Sofrer palpitações noturnas, querer te acordar no meio da noite, não se mover. Acalmar-se ao te observar dormir. Ver seus pais. Ver você nos defeitos que reclama neles. Gostar de vocês juntos. Planejar o futuro, perceber que somos péssimos em criar rotas e cancelar todas elas. Habitar planetas distantes, suplicar por colisão. Sonhar com filhos, apavorar-se. Contemplar o mais belo quadro, a posição bagunçada em que ficam nossas escovas de dentes. Repugnar a proximidade. Esperar por um casamento, achar uma bobagem colossal. Implorar por provas de amor, não precisar de mais nada. Guerrear. Estrebuchar. Mergulhar em loucuras conjugais. Listar mil razões para partir, uma a mais para ficar. Se afastar, voltar sedenta. Aceitar o fim, recomeçar a cada instante. Alcançar seu íntimo, te conhecer. Implorar pela abstinência, beber mais. Suar corpos libidinosos. Brigar. Chorar a desesperança, sorrir o amor eterno. Rir do efêmero, sentir o infinito. Aceitar. Te aceitar.